Amanhã terá início mais um Curso presencial de Direito Administrativo. O tema “Servidor Público” atrai estudantes e profissionais como interessados, apresenta complexidades e desafia atualizações contínuas. Ao dar aos inscritos as boas vindas (como fiz aqui no blog ), recebi, por mensagem, a indagação: “Como é que faz para conseguir? Escrever, pensar, organizar doutrina e jurisprudência, fazer cursos, responder e-mails, gerenciar redes sociais… Isso com uma vida real!”
Resisti em simplesmente dizer que essa é a pergunta de um milhão de dólares na vida de cada jurista do nosso tempo. Há indicações bem óbvias: disciplina obsessiva, evitar dispersão de tempo na internet, tentar dividir com equilíbrio tarefas, família, afetos e lazer, não querer abraçar o mundo com as pernas, manter o foco, não viver se desculpando por não se dedicar e coisas do gênero. Mas há coisas mais difíceis além desse óbvio. Desconfio que a principal delas é: não acredite em pensamento mágico virando realidade.
Diante de um projeto grande ou uma tarefa especialmente difícil, há uma tendência em procrastinar. Porque estudar é muitas vezes chato. Trabalhar mais ainda. Dá mais prazer instantâneo assistir um filme, cozinhar, brincar com o filho, namorar, ler o livro novo do Sandor Marai, almoçar na casa dos pais, tomar cerveja com os amigos, dançar ou ficar olhando para o teto, enquanto os dedos passeiam na tela do celular e os pensamentos voam. Distribuir livros na escrivaninha, separar artigos e decisões dos Tribunais, ler aquilo tudo, pensar, duvidar, pensar, esperar as conexões, para só aí escrever e apagar e escrever e mudar e cortar e apagar e escrever? ah, isso é chato em boa parte dos dias. Cada um que produz meia dúzia de páginas enfrenta o desafio de abdicar do resto e investir naquela escolha. Dói. Simples assim. Para a maioria dos mortais que gostamos de um bocado de coisa diferente que há esse mundão de meu Deus: é sofrido. Ainda quando há um presente no final como lecionar um curso presencial ou virtual, partilhando conhecimento.
É aí que entra em questão o básico: você já aprendeu que alguns projetos e momentos felizes exigem sacrifícios dolorosos antes? E entendeu que é preciso sustentar o investimento? Há quem tenha aprendido que a vida também tem sua cota de sofrimento periódico. Mas ainda não absorveu, na carne, que não existe pensamento mágico capaz de virar realidade. Milagres não ocorrem, salvo raras exceções. Será preciso arregaçar as mangas e fazer. Fazer várias vezes. Muitas vezes. Sem querer. Feliz e infeliz. Disposto e indisposto. Com raiva ou 100% focado. Fazer e refazer e de novo e mais uma vez. É isso que, penso, está dentro da ideia de “sustentar o que deseja”.
Para dar conta de realizar, não há que se confiar em impulsos insustentáveis como “vou escrever uma tese de doutorado que vai mudar o Direito no mundo inteiro e em 4 meses estará tudo pronto” ou “esse curso presencial ou virtual consigo estruturar em dois dias”. Pensamento mágico. Desculpe, chance mínima de virar realidade. Será preciso assentar e separar o material de pesquisa. E ler. E ter tempo para pensar. Um dia. Outro. Mais um. E mais um. Escrever. Com febre, determinado, triste, animadíssimo, focado, disperso ou de qualquer outro jeito. Terá que escrever. Talvez apagar. Escrever de novo. Manter-se um tanto afastado do facebook, do instagram e do whatsapp. Levar o texto para o orientador. Para os colegas. Para os amigos. Escutar as críticas. Fazer as mudanças. Corrigir os erros. Aprofundar a melhor parte. Com persistência e resiliência. O fato é “Não vai cair do céu, cara pálida”. Demandará tempo e ação.
Todo grande projeto começa de um sonho (isso é lindo). Que escolhemos realizar (isso é corajoso). E que precisaremos sustentar (isso é muito difícil). Quando escolherem o sonho que, projeto, será objeto de investimento, estruturem “como sustentar”. E sustentem, depois de se comprometerem interna e externamente. Entender isso implica maturidade (que, em regra, o tempo e os tombos da vida trazem) e responsabilidade (consigo e com as vidas afetadas). A gente não é o que fala. Nem mesmo quando falamos de sonhos maravilhosos. Somos o que fazemos. Nos dias de sucesso e quando surgem os revezes. Então, s’imbora arregaçar as mangas, sustentar sonhos em ações cotidianas, devidamente estruturadas, e realizar! Vale a pena demais experimentar esse processo como gente adulta, madura.
É lógico que uma escolha não é camisa de força. E realizar sonhos não é tortura. Mas em uma época hedonista, superficial e de baixo comprometimento, vale a pena lembrar que algumas realizações incríveis, que trazem felicidade impagável monetariamente, requerem além de boas ideias e estratégias incríveis, ação focada, persistente e organizada.
Aos alunos do curso TECLA SAP que a partir de amanhã estarão em Belo Horizonte na Faculdade Arnaldo estudando o tema Servidor Público: preparem-se para dividir o resultado de um projeto jurídico “sustentado” com dedicação e – pasmem! – alegria. Quem sabe, depois, vocês não se animam sair por aí realizando um bocado de Direito Administrativo?
Aos demais, aguardem. Teremos boas surpresas em breve. Sim, eu prometo. Nem só de curso presencial se vive. E isso não é um devaneio mágico. 🙂