Ainda para mães e pais
que encaram essa difícil tarefa:
Educar.
Tenho alguns sobrinhos adotados pelo coração de Tia coruja. Dois deles sempre me deram a sensação de que a qualquer momento poderiam usar alguma construção gramatical ou expressão que eu sequer saberia empregar ou o significado. Nina hoje tem 9 anos (uma quase-mocinha linda, inteligente e muito sagaz) e Léo 4 anos (encantador com sua natureza “de boas” e cachos negros apaixonantes). Seguem espertos, perguntadores, articulados, questionadores e muito conversados. Também eles estão em casa desde segunda-feira, sem aulas. A mãe compatibiliza o trabalho de professora universitária-home-office com o cuidado com os pequenos. E eis que ela publica no fb:
“Aniversário da Nina, brincávamos na sala com o Lego novo. Ela mandando em toda a brincadeira, ‘dona da bola’. Avisou ao Leo – que se divertia chamando de Geraldo o bonequinho que veio batizado na caixa como James – que o pai da Stephanie era advogado.
– O que é advogado?
– É quem trabalha na justiça.
– E o que é justiça?
– É… o presidente – respondeu ela, sem muita convicção.
Até tentei explicar algo sobre leis, normas e bem comum. Mas, nesse contexto, fiz também sem muita convicção.
Alguém aí se arriscaria?”
Não resisti. Coloquei uns parágrafos na rede social e achei que cabia dividir aqui. Tentar traduzir esse estranho mundo de leis e Judiciário e Estado para as crianças é uma tarefa deliciosa e divirto demais tentando. É preciso simplificar (no sentido de sumir com ideias complexas que são importantes, mas não vale a pena tratar), falar pouco (na infância, a capacidade de ter foco é temporalmente limitada) e ainda aproximar do cotidiano deles (para tornar a coisa mais palpável e menos chata). Vamos lá:
A gente tem de pensar que vive todo mundo junto. Nas cidades, vivemos é muito embolados! Por isso precisamos de algumas normas para fazer as coisas funcionarem. Imagine se cada um pudesse fazer tudo que dá na telha? Ia ser uma confusão danada. Então funciona tipo na sua casa: tem que ter lugar para guardar a mochila, as roupas sujas, horário de comer, de tomar banho, de fazer o dever… É para organizar e ficar bom. A gente tenta que fique bom pra todo mundo, né? Pois então. A ideia, no mundo, é também escolher umas regras boas para todo mundo, torcendo de verdade para ser o melhor para todos. Nem sempre é. Mas a gente segue tentando. E contamos com vocês nessa tarefa! Tem muita regra precisando melhorar hoje em dia.
Às vezes, as pessoas não cumprem as regras que estão valendo e que elas deveriam seguir. Aí costuma dar uma “brigaiada” danada. Quando as pessoas brigam e não conseguem resolver as coisas entre elas, acabam procurando alguém para resolver. Tipo vocês dois. Que volta e meia vão atrás de mim porque um descumpriu o “combinado” com o outro. Pois bem. No mundo, essa outra pessoa que, fora da briga, é chamada para resolver a briga é o juiz. Ele é que vai dar a palavra final, aplicar as regras, verificar o combinado, quem tem razão, quem não tem e, assim, definir como a confusão vai acabar. Depois que ele decide, se alguém não cumprir o que ficar determinado, o juiz ainda pode usar a força para obrigar as pessoas a aceitarem tudo e agirem como deveriam ter agido antes da briga.
Vocês estão sacando que, se as pessoas conseguissem resolver as coisas entre elas, nem seria preciso ter Justiça? Mas desde que o mundo é mundo, é difícil que isso aconteça. Tem sempre uns espertos, uns folgados, outros violentos… Sem falar naqueles que acham que estão sempre certos, que nunca erram, não importa o tanto que tenham “atolado o pé na jaca”. Essa turma toda acaba atrapalhando a vida de um monte de gente. E se não voltam atrás, não assumem o erro, não negociam, não tentam consertar e ficam insistindo no erro, é preciso ter uma saída. Na maioria das vezes, quem “toma ferro” dessa galera insana não consegue se proteger sozinho. Aí tem que ser alguém “de fora” e “com moral” para botar fim à confusão e fazer prevalecer as regras, o que foi combinado e, esperamos, que seja justo. Daí o papel do juiz ser tão importante.
Ah! a Justiça também é bem importante para condenar as pessoas que cometem crimes. Tipo… para prender os bandidos. Se não existisse a Justiça (nós, adultos, chamamos de “Judiciário”), o risco seria cada um que fosse vítima de bandido sair por aí fazendo justiça com as próprias mãos. Poderia haver muito abuso, muito erro… Não que não exista erro com os juízes, sabem? Mas ter o Judiciário é uma tentativa de “organizar a bagaça” e evitar coisas piores ainda. Aquela frase que eu adoro falar: “esse negócio aqui é a pior alternativa, tirando todas as outras que são bem-mais-péssimas-de-ruins”.
Tem um tanto de gente que faz parte desse sistema. É tipo uma história com vários personagens: o juiz, os advogados, o promotor, as partes que brigam, os funcionários da Justiça, um povo que tenta fazer as pazes entre os brigões antes do juiz decidir… é muita gente mesmo. Aos poucos, vou explicando como é que cada um trabalha nesse furdunço. É bem legal de entender, acreditem. Vocês vão ficar bem espertos e tenho até pena do professor e dos pais depois disso! Topam?